sexta-feira, 28 de julho de 2017

A LOUCURA COMO VOCAÇÃO

Há algo de profundamente insano em nossa normalidade,
Algo que só os suicidas sabem.
Falo de uma sabedoria de desastre,
Uma lucidez ofuscante
Que nos conduz a loucura.
Fossemos todos plenos pensadores
Não suportaríamos a existência.
Pode ser esta a razão dos limites
De toda filosofia e de toda ciência.



segunda-feira, 24 de julho de 2017

VIDA RETA

Ainda que eu fosse perfeito
Não levaria uma vida reta
Pois o certo e o errado
São como dois amantes inconformados.

Fosse eu partidário da perfeição e da virtude
Seria tomado por equivocado
Por muitos
E idolatrado por poucos.
Meus atos não teriam sentido
E careceriam de humanidade

Pois toda virtude é desumana.

quarta-feira, 19 de julho de 2017

NÃO CULTIVE CERTEZAS DEMAIS

‘Refreie as suas paixões, outas a tua razão. Mas toma cuidado para não dar rédeas soltas à sua razão.”
Karl Krauss

As  coisas mais estupidas sempre possuem uma justificativa racional. As maiores atrocidades e absurdos sempre gozam de um bom motivo na cabeça dos tolos. E como saber  que o tolo não somos nós? Normalmente isso acontece tarde demais ou, simplesmente, não acontece.

Ninguém gosta de ter suas certezas contrariadas. Mas a s certezas mudam ou desaparecem com o tempo. No fundo nada é o que parece e somos incapazes de medir o tamanho de nossa ignorância.

sexta-feira, 14 de julho de 2017

CONTRA OS OUTROS E SUAS OPINIÕES

Tenho cada vez menos o que dizer aos outros.
Também estou farto de ouvir sempre
Os lugares comuns de todos,
A vaidade e a verdade escrita na face de cada um.
Estou farto dos que tem opiniões,
Dos que defendem princípios e posições.

Sou destes que não se perdem em conclusões
Enquanto os outros se ocupam de falar demais.
Prefiro viver de perguntas

Do que da inercia de respostas prontas.

OS LIMITES DA VERDADE

Todo enunciado de uma verdade é por definição essencialista, pois busca desvelar uma verdade absoluta e oculta em meio as distorções , ilusões e aparências da realidade concreta e imediata. Tal pretensão a uma autenticidade ontológica do real é também totalitária. Se existe uma verdade, todas as possibilidades que lhe são estranhas só podem  ser classificadas como equívocos e mistificações. A verdade inventa a mentira como seu complemento mais autêntico. O verdadeiro cria seu próprio falso.

No fundo enunciados de uma verdade é uma grande armadilha que não considera a diversidade de sentidos e significados que o real comporta. Quem, afinal, define os critérios de validação de qualquer enunciado?


Qualquer sistema de crenças é perigoso quando reivindica um monopólio de sentido através da ideia de verdade. O que não significa que não podemos chegar a acordos mínimos sobre o que é verossímil  em  nossos  diferentes discursos e estratégias de construção  social  de significação.

terça-feira, 11 de julho de 2017

AS PESSOAS EM SUAS GAIOLAS

As pessoas em suas gaiolas
Cantam a vida em  doloridos cantos.
Assim passam o tempo
Inventando rotinas de prisão.
A gaiola é um mundo
Sem dimensões.
É tudo que para elas existe

Dentro do canto.

segunda-feira, 10 de julho de 2017

BREVE NOTA SOBRE SER E ESCREVER

Aprendo a escrever sem método, sem receitas acadêmicas ou hipóteses abstratas. Aprendo a escrever como quem se perde em seu próprio discurso. Escrevo como alguém que perdeu o rumo da própria vida. Invento imagens e enunciados como um bêbado. Tudo se torna para mim incerteza que precisa ser domesticada por um encadeamento de frases. Dizer é uma forma de estar vivo.

O ANIMAL QUE NOS HABITA

A intuição do sagrado, de um ordenamento metafisico, é uma das mais antigas fantasias humanas. Temos necessidade de impor uma ordem à natureza e a nossa própria existência. Precisamos de “leis” e meta narrativas do real.  Pelo menos assim foi até agora.

Mas tem sido cada vez mais difícil acreditar em um sentido do real, em nossas orientações teleológicas, sem sacrificar nosso espontâneo sentimento de não sentido, tão característico da contemporaneidade.

Pode-se aventar que  tornar-se humano, inventar sentidos e enunciados, é trair a natureza, o animal que nos habita, apesar de toda a evolução. Dentro de nós ele resiste ao esforço da ordem, do artificio cultural, como Freud parece dizer em seu Mal estar na Civilização de modo bastante pessimista.


ESCREVER COMO TRANSGRESSÃO

Ultrapassar o mundo das representações dominantes é transcender o próprio rosto, desconstruir a própria identidade, fugir de si mesmo em enunciados nômades. Esta recusa trans humana da ordem de todos os discursos é o que torna hoje um escritor relevante.

Escrever é desvelar a extraterritoriedade do real, é uma fuga e um perder-se.... É preciso desencontrar-se da realidade através das palavras. Um bom escritor evita qualquer identidade com sua escrita, despe-se de sua própria persona.


Deve-se escrever como quem comete um crime. Assim o sabemos desde o divino Marques de Sade.

A HISTÓRIA QUE NÃO FOI ESCRITA

Eu tinha uma história para contar. Mas ela fugiu de mim antes que pudesse ser escrita, como um sonho intenso que se dissipa na primeira hora do despertar.  De repente, ela simplesmente não estava mais ali. Tornou-se silencio voluntariosamente. Como se não  tivesse encontrado em mim seu vidente. Pode ser mesmo que eu não fosse digno.

Há textos que se inventam na gente, mas somos incapazes de compreende-los, de dar conta deles. É como se eles nos ameaçassem mesmo a sanidade, o equilíbrio e o cotidiano. A vida das palavras podem mesmo transbordar a gente. É como uma possessão.

Assim é a história de um texto que não foi escrito. Nem mesmo sei se era um romance, um simples conto ou um poema. Apenas me lembro que era terrível. Posso ainda intuir seu fantasma. Mas não posso dizê-lo sem correr o risco de no ato inventar  outro texto.

Mas eu tinha uma história para contar e nem mesmo sei dizer qual era seu enredo, seus personagens e o seu tempo. Acho que era sobre qualquer coisa que eu não compreendia. Ou que, pelo menos, não queria saber. Talvez ela não tenha fugido. Mas eu a tenha recusado sem perceber ou querer.

Não havia  lugar em mim para ela. Entre nós existia  qualquer desencontro entre palavras e coisas que desandavam o dizer de tudo. Era como uma luta entre o sentido e o não sentido, entre a imaginação e a realidade.   Não sei do que estou falando. Mas era uma história sobre todos nós. Ouso dizer: uma revelação!

Quem nunca teve a intuição de algo terrível por detrás das paisagens  do existir cotidiano e banal? Os loucos intuem estes subterrâneos que poderiam por tudo a perder.  As vezes nos esbarramos ou tropeçamos neles. É perigoso.... sempre é perigoso. Podemos perder o senso de realidade. Tomar como verdade a fantasia.

Quem sabe mesmo esta história que não foi escrita não seja a realidade? Tudo o que agora penso pode ser um delírio ao qual estou preso. Ninguém pode provar que estou errado  através de induções e deduções vazias que só fazem sentido quando acreditamos nelas.

Eu não acredito em nada. Não sei de nada. Apenas lamento a perda daquela história que não fui capaz de escrever, seja por que motivo for. Ela está em alguma parte e posso mesmo reconhece-la amanhã através da pena de outro escritor. Boas histórias não são fieis, não tem lealdade.

Todas aquelas pessoas dispersas que vejo no vagão de trem que me leva ao trabalho... há um pedaço desta história  em cada uma delas. É como um grande quebra cabeça. Mas claro que elas não sabem disso.  Não escrevem, não passam os olhos nem mesmo sobre um pedaço de jornal. Não fazem ideia do que carregam. Agora eu me sinto um pouco como elas. 
 

Mas meu maior problema é saber que posso algum  dia encontrar esta historia perdida nas paginas de um livro qualquer, vinculada a alguma duvidosa autoria, talvez  em uma versão distorcida e imperfeita.  Pois de tão minha ela não é de ninguém. Nunca será bem escrita.

ANIMAL HUMANO

A boca,
O ânus...
Alimentação
E defecação.
Dois momentos
De um mesmo ato
Contínuo.

Tempo e espaço
Do animal humano.

Órgãos,
Carne,
Sangue.

Nada mais
Do que isso...

Físico organismo
Deselegante,
desejante,
Que se ilude 
em pensamento. 

quinta-feira, 6 de julho de 2017

ELOGIO AO ALÉM DO HUMANO

Contra qualquer asceticismo e recusa do mundo,
Afirmo minha vontade e o meu corpo.
Quero ser mais do que pensamento
Pois não possuo alma.
Dentro de mim grita a vida
Que quer se perder no mundo,
Existir entre e através de todas as coisas.
Quero viver como um grande vento

E perecer como relâmpago.

quarta-feira, 5 de julho de 2017

SOBRE O COLETIVO VAZIO DA INDIVIDUALIDADE

Nada é mais estranho do que as convicções individuais. Cada um julga saber o mundo a partir de seu singular arbítrio e razão, quando apenas reproduz alguma tendência coletiva de opinião que, por sua vez, sobrevive justamente da impessoalidade das convicções.

O livre arbítrio é assim também: proporciona ao ego a tranquilizadora ilusão de sua relevância como instancia deliberativa do pensar e do agir, quando toda iniciativa humano é previsível, banal e condenada ao anonimato.


segunda-feira, 3 de julho de 2017

AS VANTAGENS DO SONO

Gosto de dormir...
Seria feliz caso pudesse
Viver para dormir
Em lugar de dormir
Para viver.
Nada de grandes questões diurnas,
Desta consciência das coisas
Dentro da minha cabeça
Como um câncer
A me roubar alegrias.
Dormindo  posso sonhar.
Saber outra coisa
Melhor do que a realidade.
Uma boa dose de evasão
Nos livra de enlouquecer
Como todo mundo.