terça-feira, 30 de outubro de 2018

MARIONETE



Não perdoarei os atos que me fizeram de objeto.
Conservarei rancor pelos acontecimentos que definiram minha vida,
Que deram forma ao meu modo de ser e sentir tão peculiarmente a condição humana.

Tenho horror a cada pensamento que me toma como objeto.
Faria qualquer coisa para fugir aos fatos que me domesticaram.

Sinto que há um outro se debatendo dentro de mim.
Posso adivinhar todas as suas urgências.
Ele me odeia, mas se quer me conhece.
Qual de nós, afinal estará errado?

Ambos detestamos aquilo que somos,
Aquele que nos tornamos.
O tempo foi para nós um castigo.
O que ainda pode ser onde não nos restam alternativas?




domingo, 28 de outubro de 2018

A ARTE DE DIZER

O dizer livre e descompromissado confunde-se com a arte de inventar a si mesmo.
Cultivar palavras, explorar significações, é fazer da consciência do mundo um mundo na consciência sem se perder na ilusão de qualquer verdade.

O dizer já não busca a realidade, mas seu próprio ato contra a fragilidade de tudo que se propõe a condição de verdade na lapidação da consciência como plano de construção da própria vida.
Afinal, o que está se tornando real em um mundo de ilusões transparentes?

O MUNDO COMO LINGUAGEM

O dizer compreende um espaço, uma geografia abstrata, onde inventamos todas as possibilidades do humano.

Habitamos a linguagem. Bela nos movimentamos através de signos e símbolos que circulam entre nós produzindo este estranho artifício que é a realidade.

O dizer é nosso modo de estar no mundo.

sexta-feira, 26 de outubro de 2018

LUCIDEZ PARANÓICA


Em todas as partes algo esta sempre sendo dito nas entrelinhas. Há um segredo, uma presença invisível que contamina tudo aquilo que pensamos e dizemos. Posso sentir, quase saber.... Não se deixem enganar. Nada é aquilo que parece ser. Não podemos confiar nem mesmo em nossos próprios pensamentos. Eles são implantados de modo sutil em nossas cabeças. Alguém pode mesmo dizer o que é a realidade?

Sei que não irão me levar a sério.... é assim que funciona. A intuição do caos que nos atravessa é  inconcebível. Mas não duvidem: tudo isso que estamos vivendo não passa de um grande e secular  equivoco.  

quinta-feira, 18 de outubro de 2018

OS ABISMOS DO INSTANTE


Escuto as horas que rangem no instante.
Percebo nelas sinais de eternidade,
De devir intenso de corpo e pensamento.

Tudo se resume nisso:
Todo momento é virtual,
Potência.
Habito passados desde antes do nascimento.

O instante transborda, transforma.
Não tenho mais consistência.
Sensualidade e sentido somam-se em meus atos.


quarta-feira, 17 de outubro de 2018

A MISÉRIA DAS CONVICÇÕES


Podemos eventualmente nos equivocar sobre qualquer tema ou assunto. Podemos até mesmo cultivar um equivoco e defende-lo fervorosamente. Afinal, como podemos sabê-lo?  

Por isso dou pouco credito a  firmeza de convicção, a credulidade e a defesa apaixonada de qualquer principio ou tese. Não há nada  que mereça certeza, que não fomente algum tipo de duvida. Na vida do pensamento tudo é provisório e existe sob o signo do inacabamento.

Além disso, há tantas convicções quanto existem cabeças pensantes.  Elas não são relativas, mas redutíveis a incerteza. Apenas os fracos se apegam demasiadamente as suas convicções. 

Uma postura diletante e descompromissada que reúna circunstancialmente as mais criveis formulações vigentes em uma determinada época, pode ser considerado sofisma. 

Somos amantes da boa retórica e da persuasão, mas contraditoriamente amamos demasiadamente as ilusões de verdade . 

O CORPO COMO MEDIDA DE TODAS AS COISAS



Vejo o corpo humano como uma entidade múltipla através da qual o mundo acontece como expressão humana. Desta forma não separo natureza e cultura. Pelo contrario, considero a cultura um apêndice da natureza, um, derivado da interação do corpo com a exterioridade. Viver é um complexo processo de interiorização das coisas, um fluxo entre interior e exterior que atravessa o corpo como processo, como articulação ilusória de um complexo de moléculas, de um ordenamento físico provisório que somos nós.

O corpo é através de seus predicados e de seus efeitos. Ele nos propicia a ilusão de que somos. Toda história da filosofia é o resultado do equivoco do Ser como obscura projeção da realidade do corpo.

NÃO FAÇA DA LIBERDADE UMA PRISÃO


Não há opção onde as escolhas são pré definidas  e os resultados pré configurados. Nesses casos o chamado livre  arbítrio não passa de uma forma de controle.  Este é o grande paradoxo do conceito de liberdade quando o associamos a ideia de criação. Pode-se ser fecundo e criativo  dentro dos muros e grades de qualquer prisão.

Quem pretende ser realmente livre precisa ousar acima de tudo ser livre de si mesmo, dos limites das identidades e de certezas cristalizadas. Ser livre é nunca se limitar ou se conformar a si mesmo.

terça-feira, 16 de outubro de 2018

DIZER ANIMAL


Que a palavra não diga,
Que ela nada comunique,
Mas apenas se faça como ato abstrato,
Como aprendizado de um silêncio mágico.
O som em movimento emotivo,
Como um canto em uma língua estranha,
Encanta sem dizer nada.
A palavra ininteligível provoca,
Inventa gritos e grunhidos.
É uma nota e um tom.
Quase o discurso de um animal ferido.
Ela é monólogo, expressão de uma imagem.
A palavra é símbolo.

IMPACIÊNCIA



Não me queiram correto e equilibrado,
Adaptado a todas as normas, princípios,
E futilidades do senso comum.

Não serei previsível,
Sistemático e analisável.

Sou explosivo,
Impulsivo.

 Tenho tantos maus adjetivos
Quanto tenho raivas e  agonias.
Não me queiram normal!
Não me queiram qualquer coisa!
Que tudo entre nós se defina pela distância.

CORPO TERAPIA



Saber o corpo,
Não pensar o corpo,
Sentir o corpo,
Ser o corpo.

Inventar o eu corpo como consciência,
Vivencia múltipla.

Aprender o  corpo substantivo e plural como acontecimento.

Ser  corpo/movimento,
Como tempo e espaço ontológico,
viver o corpo como o fundamento de ser.


terça-feira, 9 de outubro de 2018

METAMORFOSE AMBULANTE




Nego aquilo tudo que me conformou a mim mesmo.
Não quero saber.
Não quero ser.
Prefiro fugir através de cada pensamento,
Da aventura de cada ato.

Há sempre potência,
Virtualidade de ser e não ser.
Tudo acontece “através de...”
Há sempre um passo a diante,
Uma necessidade de partir,
De estar perpetuamente em transição.

Neste exato instante já estou distante.
Já não sou mais aqui.

O QUE NÃO EXISTE



Há algo de desmedido e urgente,
Algo de loucura,
Na consciência que me queima.

Algo que foge a palavra,
Que ronda os atos
E adestra o sentir.

É algo que não existe,
Mas que persiste
E abala auto retratos
E definições.




segunda-feira, 8 de outubro de 2018

O QUADRO, O PONTO E O CAMINHO


Um ponto dentro do quadro,
Atravessa a parede
E transcende toda representação.

Cria perspectiva, profundidades.
Deixa de ser um ponto
E se transforma em um caminho.

Para onde nos leva?
Talvez nele não exista lugar.
Apenas passagem,
Transição.

Tudo se resume em ir adiante.
Não importa o destino.
Pode ser que o movimento não pare.
Que só exista o devir e o  caminho.
Mas apenas o olhar o percorre.
O corpo permanece estático,
Indeterminado e misturado a paisagem.
O ponto dentro do quadro já não existe.
Ele fez do quadro um caminho
Que nos faz fugir da paisagem.
A parede não mais nos limita.
Tudo é o caminho.

terça-feira, 2 de outubro de 2018

CORPO DIZER




Não tenho qualquer pretensão de dizer algo que lhes pareça significativo. Pois sei que o entendimento de cada um é uma paisagem/imagem singularmente construída na unidade de um corpo que pensa. Corpo que se inventa miragem através de suas múltiplas simetrias orgânicas e vazios abstratos. O corpo vivo é movimento molecular e multiplicidades, é um pequeno caos convulso tentando manter-se contra todas as tendências a auto desconstrução. A própria vida é essencialmente um estado de alegre agonia. Então, qualquer coisa que eu diga enquanto corpo ignorante do acidente de seu proprio pensamento, seria o equivalente de um delírio, de uma consciência menor de si mesmo como potência, como virtualidade que, antes de produzir atos e fatos, artefatos linguísticos e materiais, produz a si mesmo como movimento. Ser é mover-se.... é apenas estar dentro de um instante que não se completa e replica a si mesmo. No fundo o binário tempo e espaço é um estado de confusão.  Um corpo possui um vínculo secreto com todos os outros corpos que já existiram, existem e existirão. O mesmo serve para o ato de dizer. Nunca sou eu quem esta dizendo. Há multidões acontecendo naquilo que estou dizendo.

SER CORPO



Aceitei viver todos os riscos de uma existência  vazia.
Nada de compor qualquer quadro social.
Sou apenas meu corpo e suas necessidades diárias.
Não me rotulem de outra coisa que não seja um corpo,
Apenas mais um adorno vivo na paisagem urbana.
 É só isso. Busco repouso e bem estar,
Mesmo  através do movimento.
Tudo é relativo através do meu corpo.

segunda-feira, 1 de outubro de 2018

O SABER DAS PEDRAS


Escuto a voz das pedras.
Elas antecedem o dizer humano.
Sabem mais sobre o  tempo do que meu corpo.
São senhoras da sabedoria das inercias.
Conformam a paisagem a sua estática estética.


As pedras falam sobre o imutável,
Sobre as permanências.
Sobre as mudanças guardadas no silêncio.
Elas existem no não ser das coisas.
Elas ensinam resistências.

DO EU E DO MUNDO



O que nos conduz do eu ao mundo é sempre a palavra.
Através dela tecemos sentido, inventamos a nós mesmos.
Somos o movimento de um pensamento,
Um corpo que se rearticula através de um discurso.
Há um prazer em dizer a existência,
Em acumular verdades e sentimentos.
Mas falta realidade no caminho de volta
Do mundo ao eu...