DESEJO, CAOS E IMAGINAÇÃO

O desejo sempre transcende o objeto

 e mergulha em si mesmo 

como potencia e vontade cega

 que não cabe no corpo

  ou na consciência. 

 Ele é como um fogo que tudo consome

  Inventando o absoluto além das formas,

 do humano, dos deuses, 

da natureza, e da realidade. 

 O desejo é uma grandeza sem nome, 

 tempo e espaço.

 É o absurdo transfigurado em absoluto,

 o caos em estado bruto,

 aquilo que escapa a toda compreensão.

O desejo é estéril,

é uma vontade cega que despreza toda diferença

e tudo desfaz  em calamitosa convergência

na indeterminação da matéria

que em um grão de areia

antecedeu o universo.

O desejo é a imaginação em movimento.

CONTRA A CIVILIZAÇÃO

Não acredito em deuses,

no mundo e nos homens.

Desprezo filosofias,

Formas jurídicas,

religiões, ciências,

artes e humanismos.

Definitivamente, 

nada de humano ou divino

me interessa.

Vivo em natureza

perdido entre animais e plantas,

indiferente as minhas próprias palavras.

Parte de mim é terra,

Outra parte é bicho,

e, tudo que sei,

aprendi em silêncio.

Hoje, apenas sobrevivo,

sigo indiferente ao mundo,

e isto me basta.

FELICIDADE

Felicidade era não estar em parte alguma,

era não ter opinião,

não querer nada da vida,

ser indiferente a toda necessidade e falsas opções.

Felicidade era escapar inteiramente

ao conceito, a palavra e ao verbo,

desaparecer  em um vácuo de liberdade.

Existir acima do bem e do mal,

da lei e da ordem.

Sejamos francos:

As vezes é preciso fugir do mundo,

desligar a realidade,

e esquecer de si mesmo,

ficar ali imerso e desfeito

na própria ideia de felicidade

onde ninguém e nada  é possível.

POR UMA SUBVERSÃO NIILISTA

Unir todos os descrentes e niilistas em um único grito contra a civilização e o humanismo . Eis o mais sincero objetivo dos adversários da ordem, dos inimigos da razão, de deus e do Estado.

Não acreditamos no passado da humanidade, muito menos no mundo atual, nos valores vigentes ou   tradicionais,  em todos os mecanismos de servidão e pacificação da existência.

 Queima dentro e em torno de nós uma profunda intuição de loucura.

A vida é outra coisa,  inumana e profundamente rasa (sic), que se quer fomos até hoje capazes de imaginar. 

 É preciso desacreditar, deseducar,  romper  com todas as certezas, verdades e conclusões, antes que seja tarde demais para redescobrir a existência em toda a sua intensa e banal  insanidade.

É preciso unir todos os descrentes e niilistas contra a boa sociedade.

Antes de criar algo inédito e até então impensável, precisamos frequentar as trincheiras do imprestável, provar todas as formas de deserção e sabotagem.

LINGUAGEM E MATÉRIA

O corpo falta a consciência

Tal como a consciência

falta também ao corpo.

Do mesmo modo,

o tempo

escapa ao espaço

tal como o espaço

escapa também ao tempo.

Tudo acontece 

como se fosse um jogo

entre a linguagem e a matéria

onde a realidade desaparece

sempre que a mente

ignora o corpo

ou o corpo acontece

a revelia da consciência

em sua não verbal radicalidade informal.

NADA ME FAZ FELIZ

Nada me faz feliz,

Não tenho convicções,

projetos, certezas,

medos, ansiedades ou ambições.

Só sei que o mundo é caótico,

como tudo é incerto no universo.

Absoluto é apenas o tédio

que inspira toda nossa existência

enquanto, uma vida inteira,

é menos que nada

no ser e tempo da natureza.

Nada me faz feliz,

Ninguém me inspira confiança

e tudo que é humano

me parece estranho.

Mas não sou alegre, 

nem triste.

Apenas indiferente

a consciência que me inventa

e ao teatro que reduz a um ente

entre tantos outros dementes.

DESCONSIDERE A REALIDADE

Não leve demasiadamente a sério

o teatro de nossa humanidade.

Não se confunda com o simulacro

que te forma,

não antecipe a catástrofe

que nos define.

Permaneça indiferente,

um pouco ausente das coisas.

Afinal, tudo passa.

Hoje é nunca,

considerando o amanhã

que nos arrancará a realidade.

O DESAJUSTADO

Tenho sonhado o absurdo

e buscado o impossível 

contra todos os abusos da realidade.

Tenho sido, em todos os sentidos,

um desajustado, um inútil,

um inclassificável.

Vivo a margem de toda a verdade

e tenho sido um inimigo da boa sociedade.

Não temo que me tratem como um bandido.

Pois estou radicalmente comprometido

com uma outra realidade

e com a potência do meu riso.

CONTRA A RAZÃO ILUMINISTA

A Razão iluminada nos legou um mundo de fanatismo,

desigualdade, exploração e autoritarismo.

Ela nos exigiu a obediência a nova fé materialista,

a docilidade dos corpos disciplinados e limpos,

para vitória e progresso dos brancos e civilizados,

dos bem nascidos da República.

A vida, despida de toda  ilusão de alma,

sucumbiu a divina patologia do poder de Estado e do Mercado.

Agora somos todos escravos

da racionalidade absurda dos fatos,

 dos saberes encastelados,

 da mediocridade dos especialistas.

Somos todos vítimas da modernidade,

 das técnicas e  verdades

dos esclarecidos sacerdotes da deusa razão.

Somos todos bestializados.