domingo, 16 de novembro de 2008

O SURREALISMO E O MITO DO ORIENTE ASIATICO: UMA QUESTÃO CANIBALISTA...


Uma das questões fundamentais do ideário surrealista é a recusa da cultura e valores ocidentais estabelecidos pela modernidade. Para pensar a questão é muito interessante o seguinte fragmento que nos ajuda a melhor compreender a mítica do oriente que, inerente ao culto ao primitivismo das vanguardas européias, renasceria em fins dos anos 60 através do esoterismo e do psicodelismo.

“ ...Robert Danos pede socorro aos bárbaros asiáticos, capazes de seguir as pegadas dos “arcanjos de Atila”. E mesmo os mortos, aqueles que crescem na infinita sabedoria da ásia, como Th. Lessing, alistaram-se nesta cruzada.
Vê-se assim porque esta Ásia ideal devia agradar aos surrealistas. Os sábios do Oriente já não tinham respondido às questões que os surrealistas se colocavam? À custa de uma destruição radical ou de um esquecimento perfeito- mas se pode mas se pode esquecer o que jamais aconteceu?- da lógica, do conhecimento mecanicista, das compartimentações da ciência, finalmente tudo aquilo que deu supremacia ao Ocidente, tais homens pareciam viver em uma comunhão perpétua com a essência das coisas, com o espírito do grande. Todo, se não numa perfeita felicidade- ideal vulgar- ao menos numa liberdade total. Nada de contradições dilaceradoras como entre os homens do Ocidente, nada de lutas fatigantes contra o mundo mal feito. Parecia que eles tinham descoberto de uma só vez o Segredo que os milhares de homens do Ocidente se obstinavam penosamente em descobrir.
O Oriente não é apenas a pátria dos sábios, é também, para os surrealistas, o reservatório das forças selvagens, a pátria eterna dos “bárbaros”, dos grandes destruidores, inimigos da cultura, da arte, das pequenas manifestações ridículas dos ocidentais. Eternos revolucionários, armados com a tocha flamejante e incendiária, eles, sob as pegadas dos cavalos de Átila, semearam ruína e morte, com vistas a um renascimento. E a própria revolução russa, misteriosa porque asiática, já não se apresenta aos olhos de Breton e de seus amigos como “uma simples crise ministerial”. Nela fundirão finalmente todos seus desejos ardentes, mas vagos, de evolução universal, encetado por um Oriente negado e regenerador.”

Maurice Nadeau. História do Sureealismo./ tradução de Geraldo Gerson de Souza; Rervisão e produção de Plínio Martins Filho. SP: Editora Perspectiva ( coleção Debates), s/d, p. 71-72)

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